terça-feira, 2 de março de 2010

Material calourada USP 2010: Romper o diálogo com Rodas. Abrir o diálogo com a juventude e os trabalhadores de dentro e fora da universidade!

A Universidade que temos: um debate sobre a situação da USP em 2010

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Material para as calouradas

Movimento A Plenos Pulmões e Grupo de Mulheres Pão e Rosas– LER-QI e Independentes

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Boas Vindas! E nem tão boas notícias...

Quem entra agora na universidade vê muitos motivos para comemorar: trata-se da terra prometida da excelência e do futuro promissor. Queremos recepcionar os calouros – que há tão poucos dias temiam ser barrados pelo filtro do vestibular -, com uma discussão sobre todas essas promessas.

Em um Brasil dividido e repleto de contradições, a universidade não está isolada, e é disputada por diferentes interesses. Governos procuram atrelar ensino e pesquisa ao mercado e à produção de lucro, especialmente através de “parcerias” que privatizam a universidade, dando os direitos sobre o conhecimento produzido a grandes empresas. Ao contrário, pensamos que é a serviço da maioria do povo que deve estar a universidade.

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Os ataques à universidade... e as iniciativas de resistência!
Para impor, ano após ano, seu projeto precarizador e privatizante de universidade, o governo conta com a mais profunda falta de democracia em sua gestão. A universidade é governada pelo reitor e pelo Conselho Universitário (C.O.), uma casta de poucos professores titulares, na maioria diretamente ligados às empresas e fundações privadas que se beneficiam da privatização da USP.

Desde 2000, e mesmo antes, ao lado de gerações de estudantes combativos, o SINTUSP, sindicato de trabalhadores da USP, esteve sempre na linha de frente dos processos de enfrentamento a tal projeto, barrando ataques importantes à qualidade de ensino, como cortes de verbas, e lutando contra a deterioração do trabalho na universidade, particularmente na defesa dos trabalhadores terceirizados.

Muitos dos que estão entrando agora viram as notícias nos jornais, ou ouviram falar por meio de amigos, familiares, na rua ou na escola, sobre a histórica ocupação da reitoria que durou mais de 50 dias em 2007. Uma luta que marcou a universidade, colocou lado a lado estudantes e funcionários da USP, resistindo contra os decretos do governo Serra – que então buscavam acabar de vez com a autonomia universitária e abrir caminho para um processo de privatização geral do conhecimento gerado na USP, e da própria universidade – e que terminou quase derrubando então a reitora Suely Vilela.

Em 2009, os trabalhadores da USP organizaram uma forte greve de dois meses em defesa de seus salários e pela readmissão de Brandão, dirigente do SINTUSP vítima de uma demissão política inconstitucional que é o ápice do processo de repressão política na universidade, com diversos processos punitivos a estudantes e trabalhadores. Estudantes começavam a se organizar contra a nova forma que o governo dá à precarização do ensino, a UNIVESP – Universidade Virtual do Estado de São Paulo, um programa de sucateamento e diminuição de custos do ensino, dirigido particularmente às licenciaturas para formação barata de professores, e que se enquadra no ataque mais geral dos governos brasileiros à educação, de transformação radical de suas bases através do ensino à distância de baixa qualidade. Em Junho, governo e reitoria reagem com uma medida ainda mais profunda de repressão política na universidade, que é ocupada militarmente pela Força Tática da PM, culminando na repressão violenta a estudantes e trabalhadores através de cassetes, balas de borracha e bombas que invadiam prédios de aula. A resposta foi uma forte greve das três categorias, massiva entre trabalhadores, que, novamente, quase derruba a reitora.

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Rodas: o novo reitor de Serra

Recompor o abalado regime universitário e retomar para o governo o controle sobre a USP, fechando pela direita a crise política existente: essa é a tarefa do recém-nomeado reitor, João Grandino Rodas. Portanto, não é por acaso que, pela primeira vez desde a ditadura, Serra ousa ignorar até mesmo a já tão anti-democrática escolha do reitor, deixando de ratificar o candidato mais votado pelo C.O. Afinal, o currículo de Rodas deixa claro que ele é o nome certo para o papel: como advogado, esteve ao lado da ditadura procurando inocentar o Estado de sua responsabilidade em casos de tortura e assassinato; como diretor da Faculdade de Direito, em 2007 foi pioneiro em colocar a Tropa de Choque da PM dentro da USP para reprimir manifestações – medida que defendia contra a ocupação da reitoria ; em 2008 foi responsável pela aprovação no C.O. de uma resolução que recomendava o uso de força policial para reprimir greves e manifestações políticas na USP e, em 2009, defensor da histórica ocupação militar da universidade que reprimiu duramente a organização de estudantes e trabalhadores.

No entanto, as lutas travadas desde 2007 abalaram profundamente o regime de poder da USP e, para tentar cumprir sua missão, Rodas – o grande nome da repressão – precisa aparecer como o reitor do “diálogo”, compondo um governo com distintos setores da fragmentada burocracia acadêmica, e acenando com pequenas concessões a estudantes e trabalhadores, como mesas de negociação e um discurso sobre a “necessidade de reformas democratizantes”.

O “diálogo” de Rodas, portanto, só serve à implementação daqueles mesmos projetos precarizantes e privatizantes. E mesmo assim não vai longe: já na posse de Rodas, um ato de estudantes foi duramente reprimido, resultando em 3 presos e vários feridos, mostrando que, para quem recusa esse “diálogo”, o que há é mais repressão.

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E que universidade queremos?

Ao contrário, o que queremos discutir com os estudantes é o projeto de uma universidade a serviço dos trabalhadores e da maioria oprimida e explorada da população. Um projeto para transformação não só da USP, mas do conjunto da educação, que possa ser implementado através da aliança dos estudantes de todo o Brasil, das universidades públicas e privadas, com a maioria da juventude que tem acesso negado à universidade, particularmente a pública, e com a maioria oprimida da população.

Com base nessa aliança, é preciso lutar pelo fim do vestibular e pelo livre acesso da juventude, hoje massivamente excluída dela, à universidade pública, com vagas para todos; pela expansão de vagas através das verbas que hoje são repassadas aos capitalistas para salvá-los de sua crise (por exemplo R$ 8 bi que Serra e Lula deram somente à Ford e à GM) e da estatização dos grandes monopólios de ensino privado, grande parte imperialistas, que detém 75% das vagas no ensino superior, ditam a política educacional brasileira e geram remessas massivas de lucro (o faturamento só do grupo Anhanguera, por exemplo, no 3° trimestre de 2009 foi de R$331,7 milhões) através das mensalidades exorbitantes pagas justamente pelos setores mais explorados da população, quando chegam a ter acesso ao ensino superior. O acesso à educação é uma questão democrática mínima, elementar, e não haverá democracia na universidade enquanto existir o vestibular ou qualquer filtro social que exclua a juventude dela.

É preciso lutar por uma universidade com uma estrutura de poder radicalmente democrática, gerida por todos que a compõem - estudantes, trabalhadores e professores, e na proporção em que a compõem, sem distinção, ao lado das organizações operárias e populares. Uma universidade que produza conhecimento voltado à melhoria da vida da maioria da população, em que a farmácia desenvolva remédios a baixo custo, e não patentes de cosméticos para a Avon, e as engenharias e o urbanismo, ao invés de criar patentes para a Samsung, sirvam para pôr fim às enchentes que nos últimos meses levaram cerca de 100 pessoas à morte, e deixaram milhares desabrigadas, só em São Paulo.

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O DCE da USP entrando no diálogo com Rodas

Queremos abrir um debate a partir da calourada organizada pela gestão do Diretório Central dos Estudantes (DCE) “Transformar o tédio e Melodia”, integrada pelo PSOL.

Ao longo de toda a preparação da calourada, travamos a luta política para que essa atividade fosse parte de uma campanha em solidariedade ativa ao povo haitiano, contra as tropas de Lula e do imperialismo, e para que preparasse o movimento para as tarefas que se colocarão neste ano, particularmente a de mostrar a todos os estudantes quem é Rodas e denunciar o significado do diálogo proposto pelo REItor, que tenta esconder a precarização do ensino e a repressão na universidade. Ao contrário, todos os materiais do DCE para a calourada agradecem o apoio da reitoria para sua impressão e distribuição, e para a realização da própria calourada. Mas será que esse dinheiro vem de graça? Será coincidência que, nessa conjuntura, não se leia sequer uma única vez, ao longo das 10 páginas do manual do calouro, o nome de Rodas? Ou ainda, será que o reitor financiaria uma calourada que preparasse uma luta contra os projetos que defende?

Não. E o mais grave é que esses favores materiais são sintoma de uma ligação política. Vejamos... No manual do calouro, após a caracterização do vestibular como filtro social, esperaríamos um chamado à luta pelo seu fim. No entanto, o que lemos é “Defendemos a ampliação do INCLUSP, a criação de cotas e a expansão planejada de vagas”. Frente à profunda escassez de vagas na universidade pública (25% do total e cerca de 2% da necessidade), e à exclusão da maioria trabalhadora da juventude, é o que defende essa gestão do DCE... e também Rodas em sua plataforma como candidato a reitor! Para um reitor que tem muito mais ataques do que concessões reais a oferecer, nada mais conveniente do que uma direção estudantil que apresenta como suas “exigências” justamente aquilo que ele pode dar, e que tenta se preparar para fantasiar de “conquistas próprias” dessa direção estudantil as migalhas com que Rodas já acena para fechar a crise política existente. Uma fantasia com que a gestão do PSOL no DCE já tenta se travestir, apresentando-se como disposta à luta, chamando um ato para a semana da calourada por uma audiência pública com a reitoria sobre as cotas... a que Rodas já se pronunciou favorável antes de sua nomeação! – até porque a aplicação das cotas nas universidades federais já mostrou que, mesmo com elas, o acesso ao ensino universitário continua elitista e meritocrático.

É preciso ter claro: a independência do Movimento Estudantil e de sua principal entidade frente à REItoria e aos governos é uma questão elementar. Garanti-la é uma das primeiras tarefas dos estudantes nesse ano. Não se pode combater a destruição do ensino e a privatização da universidade trocando favores com seus representantes e fantasiando de reivindicação as suas concessões. Um exemplo disso é a UNE, também integrada pelo PSOL – e que levou sua representação ao Haiti para apoiar a ocupação militar pelo exército brasileiro. A UNE, para manter seus privilégios concedidos pelo governo federal, além de defender as tropas, defende os projetos de Lula para a universidade, como o ProUni e o Reuni, dizendo demagogicamente que hoje o jovem pobre pode ter acesso ao Ensino Superior através das concessões que o Governo federal oferece, mas omitindo que estas se dão por trás também de duros ataques à educação, e principalmente mantendo o filtro altamente elitista do vestibular e favorecendo os monopólios da educação superior no país. Pelo papel que a UNE cumpre hoje, queremos abrir com os estudantes a discussão sobre a possibilidade de a recém criada Assembléia Nacional dos Estudantes – Livre cumprir a tarefa necessária de coordenar as lutas dos estudantes nacionalmente.

É preciso romper o diálogo com Rodas, via do controle do governo sobre a universidade, e, no lugar, abrir o diálogo e firmar uma aliança profunda com os trabalhadores de dentro e de fora da universidade e com a maioria excluída da juventude, via da construção de uma nova universidade, a serviço dos trabalhadores e da população!

E quem decidiu que a principal entidade dos estudantes da USP aceitaria o diálogo de Rodas? Quem decidiu que suas bandeiras seriam aquelas já levantadas no manual do calouro? Os estudantes? Não: a gestão do PSOL no DCE, de acordo com seus interesses e à revelia dos interesses dos estudantes. É preciso que se organize, já para daqui a duas semanas, a primeira Assembléia Geral dos Estudantes da USP de 2010, para determinar democraticamente a posição de nossa entidade nessas questões.

O que está por trás do conteúdo desta calourada?

Nessa calourada, organizada por uns poucos representantes do PSOL no DCE e em alguns CAs, ao mesmo tempo em que se troca favores com Rodas e se defende sua política, o SINTUSP e os setores combativos do Movimento Estudantil, que protagonizaram todo o grande processo político de lutas desde 2007, não têm voz alguma em qualquer espaço. Nenhuma voz aos setores que vêm resistindo aos projetos do governo... e um acento de honra nas mesas de debate para grandes nomes do PT e do PSDB! Para falar de educação, Paulo Renato Souza, ministro da Educação do governo FHC, responsável pela expansão anárquica do ensino privado e pela destruição e privatização do ensino no Brasil, e atual secretário da educação do governo Serra, cargo em que cumpre essencialmente o mesmo papel. E em outro debate, Paulo Vanucchi, Ministro dos Direitos Humanos do governo Lula, que retrocede frente aos setores mais reacionários do exército no ponto do PNDH sobre a tortura na ditadura (será que terá algo a dizer sobre nosso reitor Rodas, defensor dos torturadores?), e ainda embeleza a imagem do governo Lula, que mantém suas tropas no Haiti para reprimir a população, cometendo os maiores crimes contra os direitos humanos (sobre os quais Vanucchi não se pronuncia).

Mas será que é só em busca das migalhas que caem da mesa de negociações do Reitor que está a gestão do PSOL no DCE? Por que então, além de excluir da calourada os protagonistas das lutas recentes, chamar grandes nomes do PT e do PSDB? É que o PSOL tem clara sua agenda para 2010: as eleições burguesas. E está disposto a colocar as entidades dos estudantes a serviço dessa política. Nem Haiti, nem Rodas: o que, desde a calourada, pauta a atuação política da gestão do DCE da USP são as eleições, e a necessidade de se colocar como principal alternativa de esquerda à polarização entre PT e PSDB.

O DCE, no entanto, é a entidade dos estudantes da USP, e o grande desafio que lhe está posto agora é se ligar aos trabalhadores da USP, ao SINTUSP, à juventude excluída da universidade e à maioria da população para transformar a universidade, começando pela luta contra Rodas e os projetos que representa.

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A ocupação militar do Haiti

O terremoto que atingiu o Haiti trouxe caos para seu povo. Trata-se de uma enorme catástrofe natural. No entanto, não há nada de natural em suas consequências, nem na miséria que assola os haitianos há séculos, e que é produto de diversas ocupações militares, ditaduras e saques desde que o povo conquistou a independência na única revolução de escravos vitoriosa da história.
Não há nada natural na ocupação das tropas da ONU, no país desde 2004, com o exército brasileiro de Lula à sua frente. Não há nada natural nos dez mil soldados americanos presentes no país. Como exemplo do papel da “ajuda humanitária” das tropas, vimos que enquanto os próprios haitianos resgatam familiares dos escombros, os soldados defendem mercados saqueados e instalações da ONU, matam haitianos que se rebelam contra a sua condição, estupram mulheres e meninas, e impedem o pouso de aviões com comida e remédios. E por que tantos soldados e tão poucos médicos, engenheiros, etc.?

Já é difícil esconder a ligação entre a liderança brasileira desta ocupação e o interesse de Lula em um acento no Conselho de Segurança da ONU. Até o comando do exercito deixa escapar a concepção do Haiti como “laboratório” para ação repressiva nas favelas cariocas. Mais do que isso, a auto imposição dos EUA no controle da ocupação evidencia como esses governos não apenas fazem do Haiti um grande negócio - disputando, cada um de acordo com suas condições, sua fatia no bolo dos lucros da “reconstrução” – mas atendem a seus interesses políticos de manutenção do controle sobre um país devastado, lar de um povo que protagonizou algumas das maiores lutas da história.

Contra supostos interesses humanitários que camuflam os reais interesses comerciais e políticos envolvidos na ocupação e reconstrução do Haiti, é necessário que o povo haitiano seja quem controle toda a ajuda humantirária recebida, a partir de suas organizações operárias e populares. Há que se forjar uma ampla campanha de solidariedade operária e popular ao povo haitiano, e sendo o exército brasileiro de Lula que está à frente das tropas da ONU, torna-se ainda maior nossa responsabilidade de lutar por sua retirada.

Nesse sentido fazemos um chamado a todos os estudantes e organizações a construir uma forte campanha pela retirada das tropas brasileiras e imperialistas do Haiti. Particularmente, chamamos os companheiros do PSTU, que já vêm levantando essa discussão, a construir esta campanha em unidade, já desde a calourada.

Todo estudante que se revolte com esta situação deve colocar-se ativamente nesta luta. Por isso chamamos todos a se somarem às atividades, atos, debates, etc.

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Calendário
QUA. 24/2, 16h na Letras – Roda de debate sobre a situação no Haiti
QUI. 25/2, 11h na Letras – Mesa de debate sobre o Haiti, com Mara Onijá (Grupo de Mulherer Pão & Rosas), SINTUSP e convidados a confirmar
QUI. 25/2, 18h em frente ao consulado do Haiti (Av.Paulista, 1499) – ATO pela retirada das tropas do governo de Lula e dos EUA do Haiti (dia da visita de Lula ao Haiti)
DOM. 28/2, a partir das 14h – Mesa de debate e jornada cultural com bandas e artistas, em solidariedade ao povo haitiano (o dinheiro arrecadado será revertido para organizações operárias e populares no Haiti)

Veja o que está ocorrendo no Haiti em: http://solidariedadeaohaiti.blogspot.com/

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